No 1 – Pág. 37 Mais do que uma evolução da própria sociedade, a preocupação em relação à inclusão de pessoas neurodivergentes em espaços que por muito tempo lhes foram negados – ou permitidos com olhares desconfiados – foi impulsionado pelo avanço dos conhecimentos obtidos pelas comunidades científica e médica ao longo das últimas décadas. O avanço de pesquisas e estudos sobre o funcionamento do cérebro permitiu que doenças e condições neurológicas fossem diagnosticadas com mais clareza e tratadas com eficácia, diminuindo assim o trauma e o preconceito acerca do tema. Estudos mostram que pessoas consideradas neurodivergentes podem ter variações cognitivas como Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), autismo (espectro de transtornos que geralmente se manifestam em dificuldades no convívio social, comportamento repetitivo e, em alguns casos, ansiedade e TDAH), dislexia (transtorno de aprendizagem que dificulta leitura e escrita) ou dispraxia (transtorno neurológico de coordenação motora que envolve dificuldade em pensar e movimento planejado). Para se ter uma ideia do tamanho do obscurantismo que imperou ao longo da história da humanidade sobre o assunto, vale alertar sobre os relatos estarrecedores de genocídio ocorridos a partir da década de 1960 no Hospital Colônia, em Barbacena, Minas Gerais, retratados no livro Holocausto Brasileiro, de Daniela Arbex. A instituição, que era destinada a pessoas diagnosticadas com transtornos mentais, foi responsável pela morte de mais de 60 mil internos, muitos dos quais inclusive tiveram seus corpos vendidos para estudo Neurodivergentes, com Erick Motta Naturalizar a neurodivergência é humano, e não hype (*) (*) abreviação da palavra em inglês hyperbole, que se tornou uma gíria para transmitir ideias, produtos e marcas que viralizam em cursos de medicina, segundo denúncia da jornalista, vencedora, entre outros, dos prêmios Jabuti, Esso e Knight International. Além da barbárie, injustificável independentemente da condição mental de uma pessoa, chama a atenção no livro que não só pacientes diagnosticados com alguma doença mental eram internados, mas também pessoas que sofriam de problemas epiléticos, hiperatividade, depressão, alcoolismo ou que eram simplesmente tímidas. Em geral, qualquer tipo de pessoa considerada fora dos padrões sociais da época estava apta a ser internada. Casos como estes mostram o quão importante foi (e está sendo) evoluir e naturalizar a discussão sobre a neurodiversidade. Se o número de pessoas diagnosticadas está sendo tão amplo, ao ponto de ser considerado de maneira preconceituosa como “moda” por alguns, inclusive em artigos publicados na mídia, significa por outro lado que muitas pessoas estão encontrando respostas para problemas que as acompanharam ao longo de suas vidas. É o caso de Erick Mota, jornalista convidado para discutir o tema nesta última parte do especial Subjetividades, e que só foi diagnosticado com TDAH em outubro do ano passado, aos 29 anos. “A minha vida podia ter
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