Edição 1.494 - pág. 5 Me sinto honrado por ter dirigido o jornalismo do Estadão, durante cinco anos. Paulistano, acompanhei desde pequeno a evolução do diário liderado pela família Mesquita, estimulado por meu pai. Inicialmente focado no noticiário sobre o futebol e meu Corinthians. Na adolescência, com o despertar de minha paixão pelo jornalismo, devorava as páginas de política e mundo, alimentando meu sonho de ser correspondente internacional, o que acabei conseguindo, em Londres, também através do Grupo Estado. Nunca imaginei que anos mais tarde chegaria a liderar a redação do Estadão, aquele jornal do qual você poderia discordar (como discordei e discordo em várias ocasiões), mas que é responsável, confiável e coerente com seus valores históricos. Se o Estadão publicou, então aconteceu mesmo. Desde o início deste 2025, temos visto a intensa repercussão dos 150 anos da fundação do jornal. O fator comum entre todas as manifestações é a importância do Estadão para a saúde de nossa República, para a defesa de nossas liberdades e da democracia. Costumo sempre dizer que o excelente jornalismo, produzido pelo Estadão e outros grupos de comunicação no Brasil, serve como uma janela para que a sociedade possa ver o que está acontecendo nas ruas, nos gabinetes, nos campos de batalha urbanos e rurais. Através dessas janelas de informação, os cidadãos se capacitam para tomarem livremente as decisões cruciais em suas vidas. O risco ambiental, a revolução tecnológica e o recrudescimento do autoritarismo pelo mundo apenas reforçam esse papel crucial do jornalismo. Dois episódios durante a minha gestão como diretor de jornalismo ilustram bem esse argumento e são para mim fonte de orgulho. A eleição em 2018 de Jair Bolsonaro à Presidência da República foi gradualmente sucedida por crescentes sinais de que o Estado de Direito brasileiro poderia estar ameaçado. A cobertura jornalística factual sobre esses riscos e os editoriais produzidos pelo Estadão sob o comando de Antonio Carlos Pereira e posteriormente Marcos Guterman foram exemplares na imprensa brasileira ao apontarem as ameaças à nossa democracia. Riscos, como vimos depois, que eram concretos e que quase comprometeram as nossas instituições. Com a chegada da Covid, no início de 2020, logo ficou claro que não poderíamos contar com o governo federal para obter números confiáveis sobre a epidemia no Brasil, pessoas infectadas e mortas. Numa parceria inédita, os principais veículos de comunicação do País, entre os quais o Estado de João Caminoto Últimas Os 150 anos do Estadão S. Paulo, Folha de S.Paulo e O Globo, formaram um consórcio para informar à sociedade sobre os números reais da pandemia. Foram tempos intensos. Durante meses e meses, os cerca de 400 profissionais da redação do Estadão – alguns com perdas de familiares − trabalharam virtualmente, de suas casas, produzindo conteúdos para informar e orientar a população angustiada. Em algumas ocasiões, quando tive que ir à redação do Limão durante esse período, silenciosa e com suas centenas de postos de trabalho desertos, me deparei, emocionado, com a relevância de nossa missão. Puro jornalismo, servindo à sociedade, como deve ser. Os desafios para o jornalismo se renovam, sempre. Num país como o Brasil, com tantos problemas, como a pobreza crônica da gestão pública em todas as esferas, o permanente flerte com o populismo econômico, a corrupção endêmica, a imensa carência na Educação, e a vergonhosa desigualdade social, não há como prescindir de um jornalismo como o do Estadão e outros veículos de comunicação. Sem eles, não há democracia, não há liberdade, não há esperança. Simples assim. Claro, os desafios aos modelos de negócio dos jornais se tornaram enormes após a chegada da internet e das mídias sociais. Mas vejo essas décadas turbulentas como uma travessia necessária para que os jornais encontrem a melhor maneira de continuar distribuindo a sua matéria-prima, que é a informação de qualidade, de forma sustentável e independente. Paradoxalmente, a chegada da Inteligência Artificial, sedenta por informações checadas e de fontes confiáveis, pode acabar renovando o vigor financeiro e institucional do jornalismo profissional. Deixo para o fim, mas como elemento mais importante nas comemorações do sesquicentenário, o papel dos jornalistas na trajetória do Estadão. São eles, milhares de profissionais de todos os quadrantes e origens, que ao longo de décadas, bravamente, desafiaram ditaduras, reportaram guerras, revoluções, dramas humanos, façanhas esportivas e artísticas que marcaram gerações e gerações de brasileiros. Tive o privilégio de trabalhar e aprender com muitos deles. Através dos grandes Celso Ming e Fausto Macedo, jornalistas que há mais de 50 anos enriquecem as páginas e telas do Estadão, aplaudo e agradeço a todos os colegas do jornal, do presente e do passado. (João Caminoto)
RkJQdWJsaXNoZXIy MTIyNTAwNg==