Edição 1.419 página 14 Fim da editoria de esportes no NYT A decisão do New York Times em eliminar sua editoria de esportes foi arrojada, embora previsível. A aquisição do noticiário esportivo The Athletic em janeiro de 2022, por US$ 550 milhões, foi um dos movimentos mais significativos para antecipar o alcance da meta de 10 milhões de assinantes até 2025. Um ano depois, entretanto, a jogada de mestre ainda não mostrava resultados financeiros. Ao contrário, os planos do Times ao Athletic apontavam para outra direção. Ao suprimir a editoria de esportes e “substituí-la” por um produto vertical, a New York Times Company expande seu portfolio no sentido da ponta da cauda longa. Agora, ao invés de uma empresa jornalística, a marca se estabelece no mercado de games (com o também adquirido Wordle), como referência culinária (pelo aclamado vertical Cooking e sua grife de produtos), como guia de consumo e reviews (o Wirecutter), como produtora de podcasts e na cobertura esportiva de profundidade, pelo Athletic. Tudo isso, é claro, amparado pela credibilidade e força da marca que seguirá associada ao hard news global. Do ponto de vista dos negócios, o Times parece dar ensinamentos importantes para a indústria. O mais importante deles é o fortalecimento da marca em produtos de nicho e, por vezes, que vão além do conteúdo. Hub de produção de conhecimento e análise de tendências para comunicação e jornalismo Ana Brambilla A coragem de dizer não a algo estabelecido ainda é rara na indústria de mídia. Parece mais fácil e melhor aceito pelas lideranças expandir o que já é feito: cria-se suplementos e projetos especiais em assuntos do momento, abre-se perfis em todas as redes sociais, arma-se equipes especializadas em vídeo na vertical, em redes sociais, em podcast, em tablet… Atira-se para todos os lados e não se acerta o alvo. Por quê? Talvez o próprio alvo não esteja claro. A clareza do alvo está em sua singularidade e precisão. Quanto mais preciso for o propósito de uma empresa jornalística, mais ela se fortalecerá como referência em um mercado saturado de informação. Em paralelo, se seu objetivo é atingir a mais ampla audiência, entenda que seu valor nessas zonas é muito inferior. A NYT Company está se erguendo em vários alvos, mesmo que, para isso, precise amputar uma parte do seu carro-chefe. Sobreposição de coberturas A sobreposição de coberturas causou, na NYT Company, um mal estar corporativo. Desde a aquisição do Athletic, o editor executivo do Times, Joseph Khan, chegou a declarar que a empresa tinha mais repórteres cobrindo esportes do que qualquer outro assunto e que era preciso haver mais integração. A equipe do Athletic tinha quase 500 jornalistas, enquanto a editoria de esportes não chegava a 10% desse headcount. O clima piorou quando alguns desses 40 a 50 jornalistas esportivos deixavam a empresa e não eram subsituídos. Havia algo estranho no ar. Quando a extinção da editoria de esportes finalmente foi anunciada, 28 integrantes enviaram uma carta a Khan e ao presidente da companhia, A. G. Suzlberger, relatando ter vivido 18 meses de tensão com o time do Athletic. “Vimos a empresa comprar um concorrente com centenas de escritores esportivos e ponderar decisões sobre o futuro da cobertura esportiva no Times sem fazer uma ligação de cortesia para nós, muito menos solicitar nosso expertise no tema.” Embora o Times se orgulhe de ter anunciado esta transformação sem fazer demissões, o fortalecimento do Athletic junto ao veículo tende a levar jornalistas da antiga equipe de esportes à nova publicação. Por mais que essa movimentação dentro da empresa possa significar uma sobrevivência, os membros da antiga equipe se sentem rebaixados por não carregarem mais o status de repórteres e editores do New York Times e desconfiam que podem perder os benefícios trabalhistas negociados pela congregação de jornalistas do veículo. Só o tempo dirá o quanto a insatisfação da equipe incorporada poderá prejudicar a estratégia da empresa. Enquanto isso, Sulzberger tem um trabalho intenso a fazer para acomodar o clima e garantir que as rotinas produtivas sustentem a grandeza da decisão de mercado. Branded content orbismedia.org Professora do Master: Negócios de Mídia e articulista do Orbis Media Review A coragem de dizer “não” Deixar de cobrir esportes ou qualquer outro assunto tão tradicional em veículos generalistas ainda é uma decisão difícil e, por isso, evitada. Ao renunciar editorias que sempre atraíram muita audiência, veículos como o NYT estão, na verdade, se fortalecendo nas áreas onde pretendem atuar. Eles entenderam que o consumo digital de informação não é generalista e que o princípio do "tudo em um só lugar" não tem impacto nos usuários que consomem informações de diferentes sites conforme elas aparecem nos resultados de busca
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