Edição 1.411 página 38 100 ANOS DE RÁDIO NO BRASIL Por Álvaro Bufarah (*) O diferencial do meio radiofônico para os demais está baseado na aproximação com os ouvintes, na conversa, no improviso, no carisma dos comunicadores. Mas, com o tempo e o avanço do uso de várias tecnologias, o rádio passou a ser mais burocrático, até pasteurizado, pois quase não há mais diferença entre as emissoras em seus diversos canais de distribuição. Atualmente, o uso de ferramentas de Inteligência Artificial indica que as ações mais operacionais serão realizadas por IA, reduzindo custos e aumentando a eficiência das rádios. Porém o rádio poderá perder seu maior trunfo: o “ao vivo “. Esta é uma das possibilidades vistas pela professora dra. Débora Cristina Lopez, coordenadora do grupo de Pesquisa em Convergência e Jornalismo (Conjor) da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) e bolsista de Produtividade do CNPq. “Acho que é momento de o rádio, do mercado radiofônico, demarcar qual é o seu diferencial. E o diferencial do rádio é que ele vai continuar falando com as pessoas. O diferencial é que ele tem que voltar para a rua. Tem que parar de fazer rádio de dentro da redação, porque esse modelo a Inteligência Artificial fará de forma mais rápida”, afirma. Esse perfil do rádio os pesquisadores denominam de “rádio expandido”, pois analisam a inserção do meio em plataformas digitais, internet e redes sociais. “É o rádio transbordando seu leito normal de transmissão (por antena) para se expandir em outros espaços comunicacionais”, lembra a pesquisadora, citando o professor dr. Marcelo Kischinhevsky. Embora do ponto de vista da pesquisa tenha sido superada a questão de se o uso de imagens nas transmissões radiofônicas tornaria o meio uma versão da televisão ou outro produto audiovisual, a professora rebate, afirmando que se a base da mensagem é áudio, então o resultado é rádio ou uma derivação de sua linguagem. “Quando penso em rádio, posso pensar no rádio que está em redes sociais e que tem vídeo, que tem texto, que tem fotografia. Ah, não, mas isso não é mais rádio... Quando a gente pensa numa produção que tem a espinha dorsal, que tem a sua base narrativa sonora, é rádio, não importa onde esteja, não importa se está na internet ou no celular, se estou consumindo pelo tablet. E se tem fotografia, se tem vídeo, é apenas um complemento multimidia da narrativa sonora inicial”, confirma a professora, indo além em seus argumentos: “É importante para eu entender novas camadas daquela informação, se é jornalismo ou novas camadas do conteúdo, se não é jornalismo, se é ficção, criação de universo. Você dá uma outra experiência de escuta, uma outra experiência de consumo para o público. Mas o rádio ainda é o central, o áudio ainda é o central e é a partir dele que as outras linguagens se desenvolvem. Então, nós estamos fazendo rádio”, enfatiza. O rádio tem de voltar para a rua Débora Cristina Lopez Nesse contexto, os diversos elementos que compõem o rádio são afetados por essa realidade, entre eles o jornalismo, como explica a pesquisadora: “Impacta a relação com o público, hábito de consumo, gestão, modelo de negócio, e o jornalismo. Então, é pensar em jornalismo expandido, pensar um radiojornalismo que demande profissionais que compreendam essa diferença da narrativa, da linguagem, da forma de contar histórias do rádio e no jornalismo. Não é um uso aleatório, é um uso estratégico dessas ferramentas para valorizar o conteúdo e não simplesmente demonstrar o uso da tecnologia”. A professora Débora Lopez frisa que cada uma dessas plataformas ou ferramentas tem suas características de linguagem especificas, por isso não é possível contar a mesma história com o mesmo formato em todas as mídias da emissora: “Por quê? Porque o público que está em cada uma dessas redes é diferente. Porque as formas de contar a história de cada uma dessas redes são diferentes. Então, não adianta eu contar do mesmo jeito. Não adianta eu botar um vídeo longo no Instagram, não adianta editar sem dinamismo para o TikTok. Não adianta eu querer só trabalhar com vídeo no Twitter”. Para ampliar a audiência das emissoras e buscar o rejuvenescimento da audiência a pesquisadora defende fundamentalmente que temos de olhar para o perfil dos consumidores para entender as formas de consumo do áudio, para sabermos como e o que iremos produzir para o público. Caso o radiodifusor tente desenvolver uma programação sem uma visão clara dos consumidores, simplesmente não terá sucesso. Lembrando que atualmente as ferramentas digitais proporcionam uma coleta de dados riquíssima, que auxilia na segmentação dos programas/ conteúdos. A professora ainda alfineta: “Nós não queremos saber para quem falamos? Ou, pior, nós temos as métricas? Os dados nos dão um perfil de público e ignoramos essas informações, mantendo a emissora mandando para o público um conteúdo que ele não quer mais. O grande desafio é manter um perfil editorial para vários perfis de público. Sim, pois agora é no plural, perfis distintos”. Outro aspecto paradigmático da situação do rádio é que os jovens estão cada vez mais consumindo áudio em formato de podcasts, Mas os formatos “novos” apresentados são cópias de conteúdos que eram feitos nos anos de 1970 e 1980, como grandes reportagens, debates, radiodocumentários, ficção radiofônica etc. Para a professora Débora, isso faz parte da história do rádio, momentos em que se acredita que o impacto da nova onda já passou, mas uma nova tempestade tecno-
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