Jornalistas&Cia 1409

Edição 1.409 página 19 De Londres, Luciana Gurgel Para receber as notícias de MediaTalks em sua caixa postal ou se deixou de receber nossos comunicados, envie-nos um e-mail para incluir ou reativar seu endereço. Uma pesquisa da Thomson Reuters Foundation e do instituto Tow Center revelou a extensão de uma das maiores ameaças atuas à liberdade de imprensa: o assédio judicial. O Tow Center ouviu 37 especialistas em liberdade de imprensa e mais de 500 ex-alunos dos programas de treinamento da Thomson Reuters em 106 países para compreender a extensão do problema e formular recomendações. Os números comprovam a gravidade da situação: 47,6% dos entrevistados relataram ameaças legais como resultado de seu trabalho, seja diretamente ou voltadas contra a empresa jornalística a que pertencem. Segundo o estudo, 121 jornalistas foram presos por difamação entre 2000 e 2022 no mundo. O trabalho identificou oito ameaças principais. Uma delas é a abertura de processos de calúnia e difamação, usados para censurar jornalistas, impedir o debate público e proteger poderosos de críticas legítimas. Os pesquisadores observam que essa prática não é nova, mas se tornou mais comum nos últimos cinco anos, facilitada por novas leis que entraram em vigor em alguns países. Um caso destacado é o do jornalista peruano Christopher Acosta. Em 2021 ele publicou um livro sobre o político César Acuña, denunciando um esquema de compra de votos em eleições. Um ano depois, foi condenado a pagar uma multa de mais de US$ 100 mil e recebeu pena de dois anos de prisão, com suspensão condicional. O gerente da Penguin House também foi condenado. Há também as chamadas SLAPPs (abreviação de Ações Judiciais Estratégicas contra a Participação Pública, na sigla em inglês), infundadas e sem mérito. Seu principal objetivo é silenciar vozes críticas por meio de intimidação e processos caros. Outra linha de assédio judicial é acusar jornalistas de espionagem, como a Rússia fez com diversos profissionais locais e com o americano Evan Gershkovich, do Wall Street Journal. Ele está preso há mais de um mês e pode pegar 20 anos de cadeia se não for trocado por prisioneiros russos, como analistas acreditam ser a intenPesquisa aponta os oito tipos de assédio judicial mais usados contra a imprensa no mundo ção do governo Putin. A China é igualmente apontada como país que lança mão de acusações de espionagem, assim como Nicarágua, Bielorrússia e Bangladesh. Há também processos por crimes cibernéticos, uma forma de enquadrar notícias desfavoráveis postadas em redes sociais. O maior exemplo é o da jornalista filipina Maria Ressa, detentora do Nobel da Paz. Dos mais de 20 processos abertos pelo governo contra ela e seu site, o Rappler, 18 são baseados em alegações de difamação cibernética ou difamação pura. Quando a notícia não é boa, alguns tentam usar a justiça para desqualificá-la, apontando-a como fake news. Isso virou moda na era da pandemia. O estudo contabilizou mais de 50 casos em 2021. A pesquisa lista ainda o assédio judicial embasado em legislações de segurança nacional, usadas para processar veículos e profissionais de imprensa por terrorismo ou extremismo. Isso acontece sobretudo em resposta a movimentos pró-democracia em nações como Rússia, Índia, Mianmar, Etiópia, Paquistão, Camarões, Moçambique, Egito, Argélia, Arábia Saudita e Turquia. Com eleições marcadas para a próxima semana, o país governado por Recep Tayyip Erdogan prendeu no fim de abril mais de 128 opositores curdos, incluindo dez jornalistas. Em outubro passado, uma outra operação levou para a cadeia 11 profissionais de imprensa, acusados de terrorismo. Crimes financeiros têm sido também uma linha de assédio adotada em vários países, incluindo na América Latina. José Zamora, fundador do elPeriódico, da Guatemala, está preso e enfrenta julgamento por acusações de crimes fiscais. O jornal fechou e ficou apenas com a versão online, provando que o assédio funciona para restringir notícias críticas. Por fim, há uma ameaça anacrônica mas que ainda é usada: acusar jornalistas de crime de lesa-majestade ou de sedição, por notícias negativas sobre membros da realeza e autoridades. Segundo o estudo da fundação Thomson Reuters e do Tow Center, a prática é adotada em Malásia, Índia, Hong Kong e Tailândia. O estudo propõe medidas como o financiamento de apoio jurídico a jornalistas, esforços globais para descriminalizar acusações de difamação e o apoio a jornalistas exilados por causa de assédio judicial em seus países. https://encr.pw/9ZGRw

RkJQdWJsaXNoZXIy MTIyNTAwNg==