Jornalistas&Cia 1404

Edição 1.404 página 27 DIA DO JORNALISTA Centenário de Claudio Abramo − O que você é do Mário Pinto Serva? Neto? (Mário foi um jornalista importante na primeira metade do século 20, era da turma de Júlio Mesquita Filho, um dos fundadores da Folha e da Revista de Antropofagia, entre outras publicações. Liderou a campanha do Voto Secreto, por isso Getulio Vargas pediu que ele redigisse a lei que criou a Justiça Eleitoral em 1933/34, e foi o autor da Lei da Alfabetização Universal, na Constituição de 1934. Depois foi preso político no Estado Novo e comeu o pão que Getulio amassou. Na Redação do Estadão, quando Claudio começou no jornalismo, ele era uma referência, como o próprio Abramo para a minha geração.) − Não, sou seu sobrinho, ele era irmão de meu avô. − Pois quando eu comecei no Estadão, um dia ele entrou na Redação e mandou me chamar para elogiar um texto que eu tinha escrito. Aquilo foi muito importante para mim. ABRAMO FOI UM HERÓI PARA GERAÇÕES DE JORNALISTAS Eu evidentemente me derreti em agradecimentos. Ele fez de seu gesto uma espécie de retribuição. Poucos meses passaram e a Folha trocou a direção de Redação, mas o novo comando passou a Otavio Frias Filho. Claudio jamais explicitou (talvez apenas na intimidade familiar) a frustração de ter sido preterido. Comandara o jornal durante a ditadura e queria voltar ao comando na redemocratização. Viveu um pouco às turras com o destino e o mundo na condição de colunista da página 2, um espaço nobilíssimo do jornalismo brasileiro, mas não tão Leão Serva, diretor de Jornalismo Internacional e correspondente em Londres da TV Cultura Quando Claudio Abramo voltou da Europa, em 1984, depois de quatro anos como correspondente internacional da Folha (dois em Londres e os últimos em Paris), criou-se um zunzunzum de que ele voltaria para reassumir a Direção de Redação, da qual tinha sido tirado por um solavanco da ditadura, sete anos antes (ele foi substituído por Boris Casoy). Era uma noite fria e úmida de inverno frio paulistano quando, envolto nessa mística de D. Sebastião, Abramo visitou a Redação da Folha, de braço com a mulher, Radha. Pouco comentada, sua vaidade era marcante e naquele dia estava à flor da pele. Ele entrou a passos lentos, vestido com um sobretudo de gola de pele que estaria adequado ao inverno russo, com uma bengala que usava frequentemente, às vezes para expressar os ataques de fúria mas que ali só acentuava a pose de majestade que ele devia ter calculado há um bom tempo. Quem entrava na Redação da Folha passava primeiro pela Ilustrada. Ali, ele parou cumprimentado pelo jovem editor Matinas Suzuki. Cumprimentaram-se calorosamente, conversaram um pouco até que Matinas se voltou para as mesas da equipe e chamou: “Leão, venha cá, o Claudio quer te conhecer”. Eu tremi. Foi como se Prometeu me chamasse ali do alto da montanha. Fui chegando com um sorriso besta. Ele me disse: “Você é Leão Pinto Serva” (destacando o nome do meio, que eu não assino). − Sim.

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